terça-feira, 22 de maio de 2012


Ação aministrativa especial vs. Ação administrativa comum – a distinção entre o 37º nº2 al.c) e o 46º/2 al. b) CPTA

O contencioso administrativo português divide-se essencialmente entre dois meios processuais administrativos principais que constituem a dualidade Ação administrativa comum/ Ação administrativa especial.
Os critérios de distinção entre os dois tipos de ação são dois. O primeiro resulta diretamente da lei e consta do artigo 37º/1 CPTA, isto é, será ação comum aqueles processos para os quais não está estatuída qualquer outra forma em especial. É portanto um critério processual residual, na medida em que para a ação especial será expressamente identificada na lei o processo devido e tudo o resto será tratado em ação comum.
Já o segundo critério consiste naquele sobre o qual reside a questão em análise. É um critério substantivo e consiste na divisão entre atos e regulamentos administrativos - que são objeto de ação administrativa especial - e contratos, atuações informais e técnicas ou de operações materiais - que são objeto da ação administrativa comum.
Atendendo a estes critérios assim enunciados, parece sugerir-se que é simples esta distinção. Contudo ao analisar-se o 37º/2 al.c), constata-se que existem atos administrativos que cabem à ação comum diluindo assim esta distinção. Neste artigo estatui-se a possibilidade de a Administração poder ser condenada à adopção ou abtenção de atos administrativos e assim acaba por chocar com o artigo 46º/2 al.b) CPTA.
A origem do artigo 37º/2 al. c) CPTA é de inspiração alemã, mais especificamente, na “ação geral de condenação judicial” a um determinado comportamento da administração. Porém, no direito alemão, o meio processual no qual a ação comum deste artigo se inspirou tem duas especificidades: o seu objeto incide nas decisões públicas que não consistam em atos ou normas administrativas; e abrange os comportamentos tomados também por autoridades públicas e por privados.
Estas duas particularidades tornam a adaptação portuguesa difícil de interpretar na medida em que existiu uma opção pela dicotomia especial/comum e por isso a colocação de um artigo de inspiração num ordenamento que prima por múltiplos meios de processo tornou a distinção entre os dois meios um pouco mais difícil e carecida de interpretação pela doutrina.
O professor Vasco Pereira da Silva indica assim a necessidade de se fazer uma interpretação sistemática e corretiva do artigo 37º/2 al.c) CPTA (Contencioso Administrativo – no Divã da Psicanálise, 2ª edição, p. 451).
Quanto à primeira parte do artigo, ou seja, no que diz respeito à adoção ou abstenção de comportamentos da Administração não existem problemas a levantar uma vez que não afeta a distinção entre os dois meios processuais baseada no segundo critério acima enunciado.
A questão jaz portanto na segunda parte do 37º/2 al.c) CPTA dado que o legislador alarga o âmbito da ação administrativa comum à prática ou à omissão de atos administrativos. Vasco Pereira da Silva chega mesmo a referir que parece existir no contenciosos administrativo pós-reforma uma “obsessão pelo ato administrativo” (Contencioso Administrativo – no Divã da Psicanálise, 2ª edição, p.453). Assim importa distinguir para a análise desta segunda parte entre a condenação à prática de um ato administrativo e a condenação à abstenção da emissão de um ato administrativo potencialmente lesivo.
Na condenação à prática de um ato administrativo temos de conjugar o preceito como 37º/1 CPTA, e constatamos que a condenação à prática de atos será em ação comum quando não seja objeto de regulação especial. Como o 46º/2 al. b) tem regulado como ação especial aquela que se destina à condenação da administração à prática de atos administrativos, então para a situação em que esteja em causa a prática de um ato correspondente ao exercício dos poderes vinculados da Administração, a ação será sempre a especial do 46º/2 al. b) pois existe uma regulação especial no CPTA que a exclui do âmbito do 37º/2 al. c).
No que diz respeito aos pedidos de condenação à abstenção da prática de atos administrativos aqui considero que poderá ser proposta ação administrativa comum. Esta figura é também de inspiração alemã, mais especificamente na figura da “ação preventiva de abstenção”. Aqui o legislador português alarga uma vez mais aos atos administrativos o âmbito desta figura e que mais uma vez entra em contradição com o critério de separação entre os dois meios processuais existentes. Este tipo de ação tem uma função essencialmente preventiva e apesar de inserido na ação administrativa comum, há doutrina que defende aqui igualmente que esta deveria também incluir-se nas ação administrativa especial (entre eles Vasco Pereira da Silva, Contencioso Administrativo – no Divã da Psicanálise, 2ª edição, p. 455) uma vez que consideram estar aqui presente um ato administrativo.
Contudo considero que se possa tratar da abstenção à emissão de atos administrativos em ação administrativa comum do 37º/ 2 al.c) CPTA. Por um lado porque ainda não existe ato administrativo e por isso a ação irá dizer respeito a um comportamento a adotar pela Administração. Esse comportamento é anterior ao ato administrativo e pode ser imposto à Administração adotar esse comportamento com base numa possível lesão dos direitos dos particulares, pelo que ainda não precisa de haver sequer lesão efetiva. Por outro lado para dar algum sentido útil à parte final do artigo pois apesar de tudo esta possibilidade de se condenar a administração à abstenção da prática de atos era uma realidade inexistente no contencioso pré-reforma e à qual o legislador pretendeu dar reconhecimento em nome da defesa e proteção dos direitos e interesses do administrado concretizando a garantia da tutela jurisdicional efetiva.
Assim, concluo reforçando que o artigo 37º/2 al. c) deverá compreender em ação administrativa comum a condenação ou abstenção da administração relativamente a comportamentos e a condenação à omissão de atos administrativos, mas no que diz respeito à condenação desta na prática de atos administrativos deverá aqui intentar-se ação administrativa especial do 46º/2 al.b) CPTA. garantia da tutela jurisdicional efetiva.


Sónia A.C. Domingos subturma 5 nº 18421

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