terça-feira, 22 de maio de 2012

Ser ou não ser? A validade da utilização da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias para direitos, liberdades e garantias não pessoais


O artigo 109º nº1 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante CPTA) prevê uma intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias. Trata-se de uma concretização do artigo 20º nº 5 da Constituição da República Portuguesa que se refere à tutela jurisdicional efectiva. Nos termos deste segundo artigo, para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade. Só há referência aos Direitos, liberdades e garantias pessoais. A questão que se levanta é, será que se pode recorrer à intimação prevista no artigo 109º do CPTA para defender direitos, liberdades e garantias não pessoais, ou seja não previstos no capítulo I do título II da constituição, como o direito de sufrágio, petição ou associação sindical?
Para analisar a questão levantada, cabe responder a uma outra questão primeiro: porque se limita o artigo 20º nº5 da Constituição a prever os direitos, liberdades e garantias pessoais? Isto acontece dada a especial fragilidade dos bens jurídicos que suportam tais direitos, liberdades e garantias. A tutela dos mesmos reclama uma maior celeridade face à prevista no artigo 20º nº4. E também estes aparecem, uma vez serem indissociáveis do núcleo duro do princípio da dignidade da pessoa humana, principio este fundamentalíssimo previsto no artigo 1º da constituição.
Como início de raciocínio pego na posição de carla amado gomes, autora que defende a ideia de que o legislador tem liberdade para legislar sobre a protecção dos direitos, liberdades e garantias pessoais, mas está mais limitado para os não pessoais, pelo que deve considerar-se vinculado a prever mecanismos processuais que permitam salvaguardar a ponderação de interesses, controlados pelo juiz, dado o Artigo 18º nº2 da constituição, pelo que não se podem sacrificar intoleravelmente direitos ou valores com cobertura constitucional. Assim sendo, para a mesma autora, pode o intérprete entender como legitima a extensão do âmbito objectivo do meio do artigo 109º do CPTA a outros direitos desde que reconheça que o legislador acautelou devidamente a tutela de outros interesses que com aqueles conflituem.
O Supremo Tribunal Administrativo (doravante STA), no acórdão 18 de Novembro de 2004, recusou a utilização da intimação do artigo 109º nº1 do CPTA para a defesa de direitos, liberdades e garantias não pessoais. Contudo, não concordo com esta decisão apoiando-me no argumento de carla amado gomes. O regime da intimação nos artigos 109º e seguintes do CPTA prevê quatro salvaguardas para a sua aplicação: em primeiro lugar, trata-se de um meio subsidiário, pressupõe se a necessidade e adequação objectivamente controláveis pelo julgador; em segundo lugar, trata-se de um processo urgente, o meio tem de ser necessário e imprescindível para acautelar o direito, liberdade e garantia em causa; em terceiro lugar, é necessária uma ponderação de interesses, requisito este decorrente do principio do equilíbrio, artigo 110º nº3 do CPTA que remete para os artigos 78º e seguintes do mesmo código. Trata-se de uma proibição de excesso; Por ultimo, existe um limite implícito no artigo 20º nº5 da constituição, a inadequação da intimação a posições jurídicas não individualizadas, ou seja não se podem tratar de interesses difusos.
Com todas estas salvaguardas acima referidas, restringir a utilização da intimação em causa apenas aos direitos, liberdades e garantias pessoais neutralizaria a mesma, pois esta já se encontra sujeita a muitos filtros.
Em minha opinião, o STA decidiu mal, uma vez que o regime da intimação em causa não se trata de um regime tão excepcional ou que afronte os princípios constitucionais. Acrescentado as salvaguardas referidas acima, não vejo razão para que não se recorra a este meio para defender direitos, liberdades e garantias não pessoais, uma vez que se encontra claramente assegurada a tutela de outros interesses que conflituem com os direitos, liberdades e garantias a proteger.
Concluo referido que de nada vale os direito virem previstos, se não podem ser tutelados e efectivados, pelo que uma ponderação do núcleo duro da tutela jurisdicional efectiva em tudo apontaria na validade da utilização da intimação do artigo 190º nº1 do CPTA para qualquer direito, liberdade e garantia.

André Alexandre Bettencourt Morais   Nº18001              Subturma 5        4º Ano                  FDL
Bibliografia:
                               - Vital Moreira e J.J. Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa Anotada Volume I;
                               -Carla Amado Gomes, Contra uma interpretação demasiado conforme à constituição do Art. 109º nº1 do CPTA in Textos Dispersos de Direito Contencioso Administrativo;
                              

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